segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A internet ameaça a língua portuguesa?



Foram mais de 200 respostas, em dois anos e meio de fórum. E ainda hoje chegam respostas. A pergunta era simples: "O internetês é uma ameaça à língua portuguesa"? O sucesso era previsível; afinal, a questão juntava um tema da atualidade – a internet, a informática, as novas tecnologias de informação e comunicação (as NTICs) – a um assunto que afeta todos os professores: a capacidade e as formas de expressão dos jovens.

No meio dos comentários, mensagens de vários tipos que não abordam o assunto, muitas delas pedindo bibliografia sobre o tema. Outras aproveitam o espaço para fazer sugestões e elogiar o site.

O fato é que os códigos usados especialmente por jovens para sua comunicação através da internet, cheios de abreviações, reduções e emoticons, são desconhecidos por pessoas que – sendo professores, pais ou não – se incomodam com seu uso, visto que não dominam seu significado. Por isso, passam a ter medo das informações que estariam sendo transmitidas.

Ficou nítida a divisão entre aqueles que acham que sim, consideram o internetês uma ameaça à língua; e o outro grupo, que acha que não, que é apenas uma forma de expressão diferente.

Os participantes que consideram o internetês pernicioso destacam como consequências negativas o aumento de erros de grafia, visto que o estudante irá gravar mentalmente a forma que utilizou no MSN e não a que encontraria nos livros ou jornais (que ele lê mais raramente). Mais do que a ortografia, "o uso desse estilo de linguagem acaba viciando as pessoas a escrever incorretamente", na opinião de Mirian Santos. Rose Periard vai além e considera a valorização do internetês uma inaceitável "inversão de valores". Ana Cláudia Damit, ao retomar o tema de sua monografia, destaca que esse uso pode ser especialmente problemático para a criança que estiver se alfabetizando, porque ela pode misturar os códigos. São avaliações semelhantes à de Alexandre Amaro, que deu a definição mais sucinta para a questão apresentada: "português versus informática".

As pessoas que não veem como ameaça reconhecem que a linguagem da internet tem sua hora de ser utilizada; o que importa é que as pessoas saibam o momento de usar a língua formal e o código próprio do grupo. Como escreveu Ana Paula, "o que nossos alunos devem aprender é a diferenciar os momentos de utilizar esse tipo de linguagem". Quando isso não ocorre, sobrevém o que Tânia Rocha registra: "por diversas vezes peguei alunos usando a escrita do MSN nas atividades de sala de aula".

Quanto a este aspecto, Ana Cláudia Damit sugere que sejam realizados exercícios para marcar a diferença entre as situações em que deve ser usado um e outro código: por exemplo, uma comparação entre um scrap (recado) do Orkut e uma poesia de Drummond.

Outras pessoas, como Marilda Peres da Silva, consideram que, ao contrário dos que reputam-na uma ameaça, a internet "incentiva nos adolescentes a leitura e a escrita, pois é preferível eles criarem do que receberem já pronto", como acontece com a televisão (o exemplo é dela). Em relação a isso, Ana Claudia Damit destaca outra característica: o internetês é divertido, "é como a língua do pê, tem um quê de brincadeira, mesmo".

Para os internautas que defenderam o uso desse código, a pressa, a instantaneidade e a informalidade de aplicativos como chats, MSN, ICQ e o site de relacionamentos Orkut são a causa da sua disseminação.

De certa maneira, em outros tempos essa agilidade na escrita era realizada por abreviaturas manuscritas, como por exemplo a barra ( / ) para significar "mente". Dessa forma, facilmente era escrito facil/. As palavras porque, qualquer, também eram abreviadas: viravam pq, qq, tb – como, aliás, é utilizado na internet. Outras formas, como pt, ateh, soh, jah, usadas atualmente para evitar a acentuação, já eram usadas nas mensagens telegráficas e nos "pré-históricos" aparelhos de telex. Vale lembrar aqui outra forma de escrita ágil: a taquigrafia, empregada ainda hoje em ambientes formais, como as sessões do Congresso Nacional e em alguns locais do Poder Judiciário.

Ainda assim, como comenta Alessandra Marques Campos, o internetês contribui para o "empobrecimento do já pouco vocabulário dos jovens". Concordando com ela, Ana Cláudia considera que as pessoas realmente têm perdido o rigor com o idioma nas situações cotidianas. A escola e a família, que eram esses ambientes, estão mais "condescendentes", menos rígidas, aceitando um uso "desleixado" do idioma. Para ela, porém, é possível cuidar disso. Como? Criando na escola e em casa espaços e situações para usar a língua culta.

Aliás, a modalidade culta de nosso idioma está tão vinculada à escola que vários participantes mencionaram a contraposição do internetês com o ambiente escolar, não com o português. Há quem aponte soluções para que o internetês não "atrapalhe a vida dos alunos". João Carlos Paiva escreveu – ou teclou, como preferem os internautas – sua opinião abordando especificamente a escola pública: nelas, "a escrita ainda caminha a passos de tartaruga. Normalmente não há interesse para que a escrita torne-se algo de vital importância dentro do contexto educacional brasileiro". É inegável que essa é uma função que o internetês exerce com alta competência.

Para Márcia Esbrana, a agilidade desse código tem um significado mais amplo: é "um novo meio de comunicação". Sérgio Ney concorda com essa opinião: "é uma forma nova de comunicação de pensamentos, emoções e sentimentos". Na opinião da argentina Mônica Márquez, "é o jeito criativo e sintético" de falar pela internet.

Sheila Alves Brito e Fabiana Santos Farias têm uma avaliação semelhante à do linguista Marcos Bagno: é uma variação meramente ortográfica da língua, "voltada para a comunicação", nas palavras de Ana Andréa Dalloul.

Por estar fortemente vinculado à juventude, o internetês é lembrado por muitos como "o português do futuro": com o passar dos anos, os jovens não escreverão como "os antigos" (aqueles que não utilizam o código), como afirma Sueli Marques da Silva. Por sua vez, Edina registra que esse é um fenômeno internacional, que atinge outras línguas. Mais que isso: o internetês possui uma característica de todos os idiomas vivos: ele se modifica, se transforma de acordo com seus falantes ou usuários. O problema pode surgir quando o internetês perder sua função comunicativa, como supõe Francisco Borba: o internetês pode "chegar a uma forma tão condensada e complexa que se torne obscura e secreta – e aí ele perde a função comunicativa. Em princípio, tudo bem, cada um usa a linguagem do jeito que quer, com a condição de que se faça entender".

Ampliando o contexto do tema deste "Discutindo", Cida Gorito compara o uso do internetês às mudanças que vêm ocorrendo – especialmente no que se refere às comunicações – e o considera um "meio de comunicação riquíssimo".

Ana Cláudia acha "natural misturar linguagens. Os adultos também misturam, quando usam 'deletar' e 'printar', juntando inglês e português, quando o mais correto seria utilizar apagar e imprimir". Para ela, "o pior é tentar negar a presença e a força do internetês" ou querer usar esse código fora de hora

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